Publicado em: 9 de outubro de 2020 | Categoria: Planejamento

Programa de Apoio aos Enlutados: lembrar, sentir, conectar e seguir

Estamos nos aproximando do período de celebração do Dia de Finados, uma data que tem como finalidade homenagear aqueles que amamos e não estão mais aqui conosco. Algumas pessoas podem se perguntar, por que um dia para lembrar de quem morreu? Afinal, a gente lembra todo o dia, mas talvez para algumas pessoas não seja assim. Portanto, além de homenagear, este dia também pode nos trazer uma experiência diversa e é isso que vamos propor aos leitores deste texto. 

Quando perdemos alguém afetivamente importante, se processa uma grande transformação em nossa vida, o mundo deixa de ser aquele que conhecemos e essa mudança por vezes é muito impactante. Altera a percepção que temos das coisas, nossas emoções, o que pensamos e como nos relacionamos com os outros e com a própria vida. A dor produzida pela morte de quem amamos em alguns momentos é tão intensa e duradoura que temos a sensação de que nunca vai amenizar.  

Podemos recear esquecer ou ter nossas memórias gradualmente apagadas com o passar do tempo, tememos esquecer como era sua voz, seu abraço, sua presença. Outras vezes lutamos contra as memórias, pois, também sofremos com elas. Estas duas situações podem coexistir nos trazendo ora tristeza pela perda, ora alegria pelo que foi vivido com essa pessoa enquanto nos foi possível. Assim, permitir-se LEMBRAR, recordar, revisitar os momentos compartilhados, pode ser uma fonte importante de conforto, mesmo que em vários momentos sintamos tristeza, raiva ou indignação com tudo que ocorreu.

 Podemos ouvir de quem está a nossa volta, ou de nós mesmos, que precisamos ser fortes, superar… na realidade o que precisamos é permitir que esta dor se manifeste, seja expressa e acolhida por nós e se possível por quem está ao nosso redor, enfim se permitir SENTIR. A dor produzida pela falta, pela ausência, pelo que não foi dito ou vivido permanece, o tempo não apaga, a gente não esquece. Nem da dor, nem do amor, pois só dói tanto, porque amamos na mesma medida ou mais, quem morreu. Os sentimentos associados a essa dor, precisam ser acolhidos, compreendidos, expressos, portanto falar, lembrar, rir com as lembranças, chorar com as lembranças, é o que vai permitir que o processo aconteça e que as memórias fiquem claras, presentes e nos acompanhem ao longo da vida. Desta forma a dor vira saudade com o passar do tempo.

Esta transformação, de dor em saudade, que é gradual, com altos e baixos, avanços e retrocessos também ocorre à medida que esta relação que antes acontecia “fora”, com o outro, aos poucos vai se constituindo em algo que vai acontecendo somente “dentro” da gente, com  a consolidação de uma nova forma de relação que acontece a partir dos laços continuados. Desta maneira conseguimos nos CONECTAR com quem perdemos através de nossas recordações, sentimentos e pensamentos. Esta conexão também pode lançar um novo olhar sobre nós mesmos e aqui a transformação maior pode acontecer. Ao cuidar de nossas emoções e nos permitirmos viver o processo de luto, desenvolvemos um processo mais amplo de autocuidado que pode abranger: cuidar de nossa saúde, da relação com as pessoas que estão a nossa volta e de poder viver o hoje com suas alegrias, tristezas e desafios. Algumas estratégias podem auxiliar nesta conexão, uma delas é realizar homenagens em forma de rituais, sejam de despedida ou de lembrança, que tem como função marcar o que fica desta pessoa em nós. Os rituais tem significado próprio e seu sentido deve ser atribuído pelo enlutado, a partir de seu desejo de como e de que maneira prefere homenagear quem morreu.

Viver o processo de luto, ressignificar a perda de um ente querido, dar novos sentidos a vida, construir significados, são desafios que fazem parte de agora em diante, da vida de um enlutado. Na perspectiva de SEGUIR em frente, entendendo que o luto não é algo terminado, pronto, é algo vivido dia a dia, doloroso, mas também transformador.  

Neste sentido a família, amigos e outros grupos a que pertencemos podem nos apoiar afetiva e efetivamente. Em algumas situações é necessário apoio profissional para que este processo possa retomar seu rumo em direção a adaptação à perda, a uma nova relação com o mundo e uma vida diferente daquela que conhecíamos antes de perder nosso ente querido. 

Que este dia de finados possa ser de cuidado com as memórias, de homenagem a quem amamos e também, de autocuidado e de transformação. 

Esperamos vocês para um espaço de acolhimento, cuidado, lembrança e homenagem a ser realizado ainda em Outubro. 

Texto: Ana Maria Dall’Agnese e Ângela Seger